Sessenta quilos à menos. Eles nem me reconhecem mais. Engraçado como me tratam diferente agora, não? Engraçado como mudar minha aparência e me encaixar nesse famoso padrão fez repentinamente quererem se aproximar. Engraçado como usar roupas claramente de marca, fez todos quererem ser meus amigos. O dinheiro, o corpo, o rosto cheio de cirurgias. agora não tenho mais o nariz de batata que eles riam. As minhas bochechas com tamanho normal, longos cílios, costelas à menos, lábios maiores. Dez anos que não nos vemos. Saí daquele bairro aos 14, com depressão, distúrbios alimentares, transtorno de ansiedade, síndrome do pânico e mais algumas consequências. e você acha que estou falando de colegas de escola? Acha que falo de amigos que moravam da minha rua? acha mesmo que era eles as pessoas causadoras de todos esses meus transtornos? Não. Começa em casa. Começa com um pai, uma mãe, uma tia, um vô, que ri e menospreza seu corpo, que fala sobre como você esta feia e sobre como nunca terá ninguém te amando. E é assim que você começa a consumir todas as suas forças, começa a se alimentar da sua autoestima até que ela fique tão baixa que parece nem existir mais. Eu tive a sorte de encontrar alguém que me levasse pra longe daquele lugar, de me pagar tudo que eu queria, de me fazer ter o corpo que nunca julgariam. Mas será que estou feliz? Fiz isso por mim? Onde foi que eu me perdi no meio de tudo isso? Do que adiantou mudar tudo em mim se não me encontro mais neste corpo?
Letícia Pontes

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