
Eu lembro de quando ela era doce, era ingênua, era boba e toda alegre. Me enjoava a voz melosa dela e eu achava que tudo aquilo era fingimento. Boazinha demais pro meu gosto. Eu acostumei com os anos. Na adolescência voltei a pensar que ela estava querendo chamar atenção com toda aquela carisma. Nós duas nunca fomos amigas, mas estávamos sempre nos mesmos grupos de amizades. Na verdade ela sempre tentou se aproximar, mas eu era do tipo chata que empurrava ela pra longe. Foi lá pelos 22 anos que eu fui percebendo que na verdade ninguém era muito amigo dela. Aí quando o pai dela morreu, eu estava no funeral e não vi nenhum dos nossos amigos em comum. Aquilo foi tão estranho, mas eu nem comentei nada, obviamente aquele não era o ambiente. Depois aquele assunto se perdeu no meio da vida. Quando eu reencontrei com ela acho que tínhamos 27 anos já. Ela estava em um bar sozinha, me aproximei para pedir algo e ela só deu um sorrisinho. Foi por isso que eu demorei para reconhecê-la. Não era a Amanda que eu me lembrava. Ela não pulou no meu pescoço para me abraçar, não gritou meu nome chamando atenção de quem estivesse por perto e nem me chamou de "miga" como eu sempre detestei. Não éramos "migas". Eu sorri de volta, peguei meu copo e não falei nada sobre aquele olho roxo que ela tentou esconder inutilmente com maquiagem. Dois anos depois eu estava tendo meu primeiro bebe de um casamento feliz que já vinha fazendo cinco anos. Fiz um lindo chá de bebe, aqueles dos sonhos e chamei muitos amigos que eu mantinha da infância. Um deles era amigo de Amanda, e ele vem e me conta sobre o suicídio da menina.
-Pobre garota. Deixou uma carta para os pais. Tinha até seu nome nela, sabia? Era louca pra ser sua amiga. Disse que você ignorou ela num bar. - Ele falou debochado. -Vê se pode, como se vocês fossem grandes amigas. Aposto que tinha inveja de você. Ninguém gostava dela mesmo.
Letícia Pontes
Comentários
Postar um comentário